segunda-feira, 30 de março de 2009

CRÔNICA DA SEMANA

O GRANDE RUBENS
(Arnaldo Filho
)

Escola pública do interior do Tocantins, lá estuda o aluno Rubens, ou melhor, o Grande Rubens, nível fundamental, mais especificamente no 7º ano “B”. Este é um aluno que contraria aquela lei “do menino imperativo” da pedagogia. Aquela que pedagogos e psicólogos enchem a boca ao falarem quando percebem que o aluno é imperativo. A palavra da moda. Aliás, o Grande Rubens parece estar sempre no mundo da lua, estudando o abstrato, menos o conteúdo dado em sala. A aula pode até ser interessante, mas suas passadas são lentas. Parece carregar uma carga genética de lentidão, está sempre dizendo: oh professor! Não professor! Deixa-me embora, professor... Esse é o Grande Rubens, sempre dizendo que vai deixar comida na roça pro seu pai e por isso gostaria de sair mais cedo.
O Grande Rubens é diferente de todos os alunos da escola. Ao entrar na sala, põem sua cadeira próxima à porta e tira suas sandálias dos pés e os estira na entrada da sala. Dificilmente deixa seu trono, mas quando resolve levantar, sai arrastando os pés, atrapalhando os colegas e dando passos curtos e vagarosos.
Seus trabalhos são repletos de borrões e usa, preferencialmente, caneta vermelha, talvez para destacar dos outros ou mesmo fazer confusão com as possíveis respostas. Os seus professores procuram nas entrelinhas dos seus rabiscos algo que se pareça com a resposta.
Esse é o Grande Rubens, hora ou outra dar uma olhada pra fora da sala buscando algo que o distraia. Um moreno forte de 14 anos que parece andar sem destino, seu desanimo o faz repetir sempre a mesma frase: “eu não consigui fazer a terefa de casa”. Ele dificilmente tenta resolver seus problemas.
E não adianta falar-lhes da forma que Raul Seixas pregava em suas canções, como aquela que nos diz, “veja, não pense que a canção estar perdida, tenha fé em Deus tenha fé na vida, TENTE OUTRA VEZ”, ele jamais tenta.
Na hora da brincadeira, se for daquelas em que se usa a força, os colegas saem em desvantagem, se o negócio for futebol, a realidade se inverte. Neste momento Rubens fica sentado ou passeando pelo pátio procurando algo de errado pra dar conta.
Os professores é que sofrem nas mãos do Grande Rubens tentando mostrar-lhes um novo horizonte. Na hora da prova, a sua primeira pergunta é instigadora e quase sempre a mesma: “professor é de marcar?”. Sendo “de marcar”, resolve tudo rapidinho, não sendo, só assina o nome e faz aquela brincadeira do “mamãe mandou eu marcar essa daqui” e pronto.
Esse é o grande Rubens, o marcha lenta...

sexta-feira, 27 de março de 2009

MOMENTOS DE REFLEXÃO

SE QUISERMOS VENCER!
(Arnaldo Filho)

Se quisermos vencer, devemos renunciar a nossa ignorância, nossa estupidez, nossas fraquezas.
Devemos às vezes ir contra o nosso coração, deixando as pessoas que mais amamos para seguirmos em frente.
Se quisermos vencer devemos engolir a seco as mágoas, a solidão, o cansaço, o choro, enfim, devemos dizer não as coisas mundanas de prazeres carnais. Trazer a humildade para nossa mente e para o nosso coração.
Ainda se realmente quisermos vencer devemos ter muita fé em Deus para enfrentarmos nossos obstáculos não como meros empecilhos, mas como aprendizado e valorização pela luta. Não o bastante, devemos ter saudades daqueles que nos deixam com o coração dilacerado.
Sem esquecer da essência pela qual existe a vida. Pois, se quisermos vencer devemos amar, perdoar e muitas vezes humilhar-se.
As dificuldades são para que possamos caminhar com nossas próprias pernas; as saudades são para que possamos dá mais valor a tudo que temos, as lágrimas são para tirarmos as impurezas existentes dentro de nós; as perdas são para que possamos dá mais valor às pequenas vitórias; o sonho é para nos manter vivo e confiante; o amor é para que possamos amar mais nossos irmãos. Porque em tudo há uma razão pelo existir, mesmos nas pequenas coisas que por nós são desprezíveis.

“Luta nem sempre é sinônimo de vitória, mas vitória sempre é sinônimo de luta”.

“A pior hora para reconhecermos nossos erros é depois que já choramos por orgulho de não reconhecê-los”.

Zezão do Gato >> Arnaldo Filho >>


Já se passavam das vinte e uma horas da noite de sábado, quando, fui exaustivamente, surpreendido por um tenebroso barulho no meu portão, as batidas eram tão fortes que estremeciam o chão. Então, logo corri em direção as batidas, assim, meio que assustado, tropecei por cima de um tamborete, derrubei uma panela com arroz que estava sobre a mesa e quando cheguei lá, ele suspirava, quase sem fôlego.
Era o velho Zezão, meu vizinho, somos amigos desde crianças. Ele estava muito assustado, chorando pra valer.
- O que foi homi de Deus? Tu tá ficando maluco? - perguntei-lhe.
- Oh meu irmão, tu nem imagina a desgraça que acorreu em minha vida - chorou Zezão.
- Então fale criatura! Vamos... Depressa! Assim vou dar um ataque de nervos - disse-lhe.
- Foi tudo minha culpa Chico. Eu não devia...
- Oh homi danado, mermo na hora do desespero ele não fala o que está sentindo - murmurei.
Então corri e peguei uma jarra com água, de uns dois litros, e fiz com que ele bebesse toda a água para acalmar um pouco e me esclarecesse a situação.
Porém, Zezão estava tão louco que, na mesma medida em que a água descia em sua garganta ela saia nos seus olhos, também estava tão pálido que mais parecia um maracujá amarelado, expressando um sentimento enorme de culpa.
Aquela situação estava me deixando encucado, e depois de alguns minutos, quando pensei que tudo estava sob controle e eu finalmente saberia que bicho era esse que picou meu amigo, lá se vem a esposa do Zezão, a comadre Francisca e seus dois filho, o Zezão Filho e o Zezim do Tiquin – recebeu esse apelido de Tiquin, por que toda vez que saiam para comer fora, ele falava pra sua mãe que queria só um tiquin – como sempre escandalosos, gritando e chamando a atenção de toda vizinhança. Com isso, foram se aproximando muitas pessoas, “os curiosos”, se formando aquele alvoroço bem ao meio da rua, mais parecia o Iraque em guerra, todo mundo correndo assustado.
O compadre Zezão até que enfim se acalmou e, em seguida, abraçou sua esposa e seus dois filhos e convidou-me para acompanhá-los até sua casa. Eu muito curioso e ansioso também para saber do pepino, fui quase correndo.
Ali já se encontravam quase todos os moradores do bairro. Uns comentavam entre si:
- Será o que aconteceu? - perguntou um.
- Não faço a mínima idéia - disse outro.
- Será se foi a sogra dele que faleceu? – indagou um garotinho zombeteiro.
Um outro sem querer ficar pra trás, acrescentou:
- Se estivesse sido, seria motivo de alegria e não de tristeza!
Quando entrei em sua casa, ouvi um cochicho do compadre Zezão com a comadre Francisca citando a palavra caixão, fiquei mais aterrorizado à beira de um piripaque. Os vizinhos, mesmo sem serem convidados, foram entrando e se acomodando da maneira que podiam, foram tantas as pessoas que a sala já não suportava mais. Então Zezão me chamou dentro do seu quarto e disse-me:
- Eu não quero ver, Chico.
- O que meu irmão? - perguntei-lhe.
- O meu gato morto, coitadinho dele. Eu coloquei comida pra ele, mas se recusou a comer, talvez estivesse ruim. Então ele indignou-se e subiu no alto da casa e pulou. Foi um suicídio compadre. Devo ser condenado à forca, sou um covarde!
- Calma! Calma Zezão – disse-lhe.
Aos poucos toda aquela multidão foi saindo, e se podia ouvir algumas murmurações:
- Cada um com suas loucuras. Ele é maluco mesmo...
Depois daquele dia, todos no bairro passou a chamá-lo de Zezão do Gato.
Para ele, foi uma das maiores tragédias já acontecida em sua vida: “A morte de seu gato”.

Nas lonjuras do Tocantins >> Arnaldo Filho >>


Nas lonjuras do Tocantins, o tempo de tão quente, o sol radiante, faz com que o forasteiro, despercebido do clima, franja a testa que alumia no sol das duas da tarde. Hora ou outra aquele forasteiro leva sua camisa até o rosto para enxugar seu sofrimento com um gosto salgado.
As lonjuras do norte do Tocantins. Cidades pacatas, povo humilde e hospitaleiro, apreciam uma suave conversa com o vizinho ou mesmo do vizinho ou de quem passar na rua naquele momento. O papo dos finais de tardes. O desgaste da língua na vida do outro. As comadres não perdem o babado sobre aquele moço novato na cidade ou mesmo daqueles que injustiçadamente se embriagaram na noite e amanheceram no relento das ruas. Tudo é motivo de comentários. Se o sol está quente, aquela pobre arvore serve de abrigo àquele grupo de jovens que deserdam o trabalho e vive como andarilhos pelas sombras. Isto é o que chamam de “rádio pião”. Os grupos de novos e velhos que dão notícias de tudo que acontecem nas cidadezinhas. O povo do “fulano disse que disse”. O mais importante é o Fulano e o Cicrano. O fuxico vale mais que as notícias do jornal nacional.
Tardezinha é sempre um momento de “reflexão”. Até mesmo a igreja é ponto de “reflexão”. Seja do fuxico ou de oração. Ô vida tranqüila, povo hospitaleiro e sol ardente. Ô calor ferrenho das lonjuras do norte do Tocantins. As carecas iluminadas no sol refletem bem a vida do sertanejo trabalhador de roça e alguns aposentados que manejam o seu dinheiro para as pequenas farmácias a fim de viverem um pouco mais sobre aquele sol tenebroso. Às vezes, em alguns aparenta terem levado um banho de óleo ao sol. Com tanta emissão de CO2 na atmosfera as arvores ainda sobrevivem e servem como um refúgio ao pobre sertanejo. Nas lonjuras de todo o Norte brasileiro.

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